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terça-feira, 24 de julho de 2012

Der Spiegel - Revisitando um massacre sírio: A busca da verdade por trás do massacre de Houla


Pessoas se reúnem para enterro coletivo das vítimas do massacre de Houla
A princípio, a ONU (Organização das Nações Unidas) estava convencida de que o governo sírio fora o responsável pelo brutal massacre de Houla. No entanto, mais tarde a organização começou a duvidar disso. "Der Spiegel" foi até à cidade para entrevistar sobreviventes e testemunhas e conseguiu reconstituir a terrível chacina.

Não vai acontecer nada, garantiu Muawiya Sayyid, um policial aposentado, à sua família na tarde do dia 25 de maio. Eles estavam com medo de sair de casa, mas Sayyid lembrou à família que ele foi coronel da polícia e que os militares vinculados ao regime não tinham sido vitimizados em ataques anteriores.

Mas, durante os últimos minutos da sua vida, o coronel Sayyid com certeza foi obrigado a reconhecer que cometeu um erro de cálculo fatal. Segundo a mulher e a filha de Sayyid, ele estava no seu quarto, no segundo andar, quando escutou os assassinos em frente à casa combinando que primeiro trariam as mulheres para fora e depois matariam todo mundo. Ele disse à mulher e aos filhos que fugissem. “Eu tentarei contê-los”, disse o coronel. Ele conseguiu, mas acabou pagando por isso com a própria vida.

O massacre de Houla, no final de maio, que provocou a morte de 108 moradores --incluindo 49 crianças e 34 mulheres--, segundo a ONU, a maioria executada com machadinhas, facas e armas de fogo, chocou o mundo. Os observadores da ONU conseguiram ter acesso ao local do massacre, onde puderam ver os corpos e confirmar independentemente o que ocorreu lá. Os embaixadores sírios na ONU e em 12 países, incluindo a Alemanha, foram expulsos. No dia 1º de junho, o Conselho de Direitos Humanos da ONU condenou o regime sírio e as suas milícias shabiha pelo massacre, e a Rússia e a China votaram contra a resolução. O governo sírio, no entanto, responsabilizou “terroristas” pelo incidente e denunciou aquilo que chamou de um “tsunami de mentiras” relativas ao massacre.

Mas foi então que as opiniões começaram a mudar. Com o passar dos dias, a ONU começou a questionar as suas conclusões originais. Em 27 de junho, o Conselho de Direitos Humanos discutiu um relatório preparado pelo seu comitê sobre a Síria, que concluiu que não havia provas suficientes para determinar quem de fato cometeu o massacre.

Nos dias 8 e 14 de junho, o “ Frankfurter Allgemeine Zeitung”, um dos principais jornais alemães, publicou dois relatórios baseados nas declarações de testemunhas anônimas, que alegaram que membros da oposição armada cometeram o massacre e, a seguir, responsabilizaram o regime de Assad. Segundo os relatórios, 700 integrantes do Exército Sírio Livre chegaram a Houla vindos de várias cidades a fim de matar famílias que se converteram ao alauísmo e ao xiismo e não se juntaram à rebelião. No início de junho, Jürgen Todenhöfer, um membro do parlamento alemão pelo partido de centro-direita União Democrata-cristã, investigou a questão e criticou duramente os rebeldes por aquilo que ele chamou de “marketing do massacre”.

Ao alcance de francoatiradores
Desde o dia 26 de maio, quando Alex Thompson, da rede de televisão britânica Channel 4, juntou-se aos observadores da ONU em Houla durante algumas horas, nenhum jornalista estrangeiro havia estado na cidade para examinar o local e conversar diretamente com membros das famílias massacradas e testemunhas do ataque.

Agora, porém, uma equipe de “Der Spiegel” conseguiu visitar o lugar onde o massacre ocorreu: Taldou, a maior dentre quatro vilas bastante distanciadas entre si e que formam o município de Houla. Foi complicado chegar até lá. O regime sírio não deseja jornalistas estrangeiros no país, especialmente em Houla.

A região também é rodeada por um círculo de aldeias alauitas, onde o exército sírio montou bases a partir das quais ele continua a disparar contra Houla com tanques de guerra e artilharia. O regime fornece armas às vilas, que por sua vez as repassam às milícias shabiha, que apoiam Assad e que montaram barreiras com elementos armados nas estradas e estão participando dos ataques.

A própria Taldou, que antes da revolução tinha mais de 15 mil habitantes, está sob o controle dos seus próprios moradores. Eles formaram uma unidade do Exército Sírio Livre, que os protege de ataques de menor intensidade, mas não dos bombardeios. Partes da vila, incluindo uma das áreas nas quais ocorreu o massacre, continuam inacessíveis, já que estão ao alcance de francoatiradores posicionados em montanhas que cercam o local.

A equipe de “Der Spiegel” passou dois dias em Taldou, onde pôde se locomover livremente, entrevistar sobreviventes das famílias de Sayyid e Abdul Rassak e conversar com testemunhas. Algumas das testemunhas falaram diante das câmeras, mas outras preferiram permanecer no anonimato porque ainda têm parentes na prisão ou que moram em cidades controladas pelo regime. Para impedir que as memórias coletivas interferissem com as suas próprias experiências, as testemunhas foram entrevistadas individualmente e solicitadas a dizer aquilo que viram e ouviram.

Após as orações da sexta-feira, 25 de maio, os moradores de Taldou fizeram as suas usuais marchas de protesto contra o regime. Foi então que, no início da tarde, forças do exército sírio começaram a bombardear fortemente a vila a partir de várias bases que cercam a localidade. Unidades do Exército Sírio Livre lançaram contra-ataques contra vários postos do exército. No entanto, as testemunhas dizem que praticamente não havia combatentes do Exército Sírio Livre em Taldou naquela tarde, e que foi por isso que os esquadrões de extermínio que avançavam não encontraram nenhuma resistência. Ainda era dia claro quando o primeiro grupo chegou.

Testemunha 1
Na tarde de 25 de maio, Mohammed Faur Abdul Rassak estava a caminho da sua casa na rua Sadd, que cruza a rua onde moravam as vítimas do massacre. Ele havia telefonado para a sua casa após ter ouvido boatos de que grupos shabiha de várias localidades, incluindo a vila de Fullah, cuja população é exclusivamente alauita, estavam a caminho de Taldou. “Eles estão formando grupos”, lhe disse o seu pai, afirmando que havia muito tiroteio nas ruas e que a população estava com medo de sair de casa.

“Pouco depois das cinco horas da tarde, eu estava perto da nossa casa, de onde dá para ver a estrada para Fullah na montanha. Cerca de dez carros e pelo menos 400 homens se aproximavam pela estrada. Alguns deles usavam uniformes militares, e outros roupas civis. Alguns tinham barbas longas e as cabeças raspadas. E alguns usavam braçadeiras vermelhas. Um segundo grupo, consistindo de cerca de 30 homens uniformizados, chegou de uma área de canais na qual o soldados do exército estavam estacionados. Eu me aproximei da minha casa devagar e me escondi na rua Sadd. De lá, fiquei observando enquanto os homens se espalhavam rapidamente e colocavam um sujeito de guarda com uma metralhadora em uma esquina, de forma que eles pudessem monitorar a área. Os dois grupos provavelmente se encontraram lá. Eu vi quatro ou cinco homens, usando roupas civis e uniformes, entrarem em cada casa. Eles portavam fuzis Kalashnikov e, sempre que entravam em uma casa, eu ouvia pouco depois alguns tiros serem disparados. Alguns soldados me viram, e eu corri para um lugar a cerca de 400 metros do local em que eles se encontravam. Eu escutei outros tiros por volta das 19h, mas esses disparos pareciam mais ser uma espécie de comemoração. Quando a ação deles pareceu ter chegado ao fim, um amigo me deu uma carona na sua motocicleta e nós encontramos 12 corpos da família de Samir Abdul Rassak na primeira casa em que entramos”.

Testemunha 2
Da sua casa na rua Sadd, Jihad Raslan, um funcionário público que estivera de folga nos quatro dias anteriores, viu homens armados usando roupas civis e uniformes se aproximarem de uma plantação de oliveiras entre a vila alauita de Fullah e Taldou por volta das 18h30.

“Eu vi mais de cem homens, mas era difícil precisar exatamente o número. Os disparos de artilharia haviam cessado. Eu saí cuidadosamente da minha casa para verificar o que estava acontecendo. Uma mulher, que caminhava na minha direção, vinda da direção oeste, me reconheceu e me disse: 'Eles estão matando as pessoas!'. Por volta das 18h, eu vi uma outra mulher com ferimentos provocados por arma de fogo estendida na rua, e ela me avisou: 'Eles estão entrando nas casas e executando os moradores!' Eu esperei, e continuei a ver pessoas fugindo até as 19h. Meia hora mais tarde, eu saí com uma lanterna, porque havia faltado luz. Entrei em três casas seguidas. Na primeira, a residência de Samir Abdul Rassak, uma mulher estava morta e havia várias mulheres e crianças feridas a bala em um outro aposento. Eu vi Mustafa Abdul Rassak caído em uma grande poça de sangue, ainda respirando, em frente à segunda casa. A família morta estava dentro da casa. E havia mais de 20 corpos na terceira casa, que pertencia a Abu Shaalan Abdul Rassak. Eu ajudei a colocar os corpos dentro de carros e a levá-los até a mesquita e segui para casa para proteger a minha família.”

Testemunha 3
O tenente Malik Baqur, um conhecido de Jihad Raslan, estava na casa do seu primo na rua Sadd quando ouviu dizer que homens armados estavam chegando em Taldou, vindos de Fullah.

“Até as 18h, o bombardeio foi tão intenso que eu fiquei com medo de sair de casa. Mais ou menos às 17h30, eu vi 40 homens usando uniformes e roupas civis vindos de Fullah. A maioria deles caminhava, mas eles estavam atrás de uma caminhonete prateada que tinha uma metralhadora montada na carroceria. Eu tinha visto aquele veículo alguns dias antes em uma barreira militar que foram instalada em Fullah pouco antes. O local em que eu me encontrava era um pouco mais elevado, de forma que eu pude ver os homens até eles chegarem a cerca de cem metros da vila. Depois disso eu corri até onde Raslan se encontrava, e nós entramos juntos nas casas e vimos os corpos. Alguns estavam com os crânio abertos, como se tivessem sido atingidos por um machado de açougueiro, e outros tinham sido baleados na cabeça, em estilo de execução, apresentando ferimentos que consistiam em um pequeno buraco na parte posterior e um buraco maior na parte anterior do crânio. Eu contei 17 corpos na casa de Mustafa Abdul al-Rassak”.

Outros sobreviventes viram o grupo vindo de Fullah, e eles também se recordam de detalhes similares, como as braçadeiras vermelhas que foram vistas por uma mulher idosa, que não quis que o seu nome fosse revelado: “O soldado de uniforme verde que veio de lá estava usando a braçadeira. Todas as portas estavam abertas porque nós ainda pensávamos que aquilo seria mais uma batida militar, como aquelas que haviam ocorrido várias vezes antes. A minha nora disse que só havia mulheres e crianças na casa e que os homens estavam trabalhando no Líbano. Eu estava atrás da porta quando ele chegou e começou imediatamente a atirar.”

Foi a crença equivocada de que os homens estavam lá apenas para conduzir uma batida policial que custou tantas vidas --e também salvou as vidas de outros, como Mustafa Abdul Rassak. Ele tinha se escondido em uma granja abandonada cerca de 50 metros atrás da casa por temer ser preso como rebelde.

Após a primeira onda do massacre, no final da tarde, houve uma segunda onda em outra parte de Taldou, entre as 23h e as 4h do dia seguinte. Como estava escuro, nenhum dos sobreviventes viu de onde saíram os assassinos. Mas, como as casas ficavam entre dois postos do exército, seria quase impossível que rebeldes se locomovessem facilmente de casa em casa e matassem os moradores sem entrar em confronto com soldados.

Testemunha 4
Era tarde da noite, e Ali Adil Sayyid, de 11 anos de idade, não conseguia dormir havia horas devido ao bombardeio de artilharia próximo.

“Eu escutei vozes lá fora por volta das 23h. 'Desliguem as luzes! Abram a porta!', disseram eles. Mas estava faltando luz, de forma que não havia nenhuma luz a ser desligada. Eu os escutei golpeando a parte de baixo da porta, mas depois eles foram embora. Eu acordei novamente antes das 4h, quando os homens vieram até a minha casa. O meu irmão e eu estávamos deitados na sala. Quando a minha irmã, Rasha, tentou correr, um dos homens atirou nela. O meu irmão Adil ainda estava dormindo quando um homem o matou a tiros. Um pedaço da cabeça de Adil foi arrancado por um tiro. O homem também atirou em mim, mas ele não me acertou. Eu rolei para o lado e me fingi de morto. Depois o homem pegou dois televisores, a nossa máquina de lavar e o computador. Eu ouvi o som de um BMB lá fora” (BMB é um tipo de veículo blindado usado pelo exército sírio).

De acordo com Ali, o seu irmão Nadir, que estava gravemente ferido, “ainda estava emitindo ruídos, como se tivesse soluços, mas depois morreu”.

Ali Adil Sayyid, o único sobrevivente da sua família, é parente distante de Abulmuti Mashlab, um membro do parlamento sírio. Esse fato levou observadores da ONU a concluir que essas pessoas foram assassinadas devido aos seus laços familiares com um membro do regime. Mas, segundo Ali, Mashlab é apenas tio da mulher do seu tio. Ali conta que ele e o seu pai participaram de várias manifestações até o outono do ano passado. “Nós sempre comprávamos kebabs e refrigerantes primeiro!”, diz ele. “Mas o meu pai foi preso em novembro e, depois disso, eu fiquei com medo de participar das manifestações”.

Testemunha 5
A família de Muawiya Sayyid, o policial aposentado, morava na mesma rua, algumas casas adiante. A filha dele, Maryam Sayyid, estava em frente à janela, dentro de casa.

“Foi quando um grupo de soldados aproximou-se, vindo do canal, pela primeira vez, a mais ou menos às 16h30. Eles vieram atirando para cima e bateram com força na nossa porta. Mas, como ninguém respondeu, eles seguiram adiante. Nós nos sentimos seguros. O meu pai foi policial durante 30 anos, tendo chegado à patente de coronel. Nada de ruim havia acontecido conosco nas batidas militares anteriores. O meu irmão também estava na casa. Ele era soldado e tinha quebrado a perna, de forma que não podia se locomover. O meu irmão não recebeu nenhuma folga durante quatro meses porque ele era de Houla, o que o tornava suspeito. Ele só teve permissão para retornar para casa devido à perna quebrada. Mas nós não tínhamos medo do exército. E se eles eram terroristas, como foi que conseguiram passar por duas barreiras militares? O que nós temíamos eram os tiros de artilharia que tinham sido disparados durante horas. Ainda estava claro lá fora, e a nossa casa era a última da rua, de forma que ficamos com medo de fugir. Por volta das 18h, nós ouvimos um tanque na rua e homens em um carro que gritavam: 'Shabiha para sempre! Com o nosso sangue e as nossas almas, nós nos sacrificamos por você, Bashar!' Nós nunca havíamos ouvido isso antes."

"Estávamos dentro de casa. O meu pai se encontrava na sala que dá de frente para a rua, e todo os outros estavam no aposento do lado oposto. Por volta das 23h, nós ouvimos vozes por alto-falantes que diziam: 'Apaguem todas as luzes! As velas também!'. Eu fui ver o meu pai no outro aposento. Ele tinha acabado de ouvir os homens que estavam lá embaixo, em frente à porta, dizendo que iram pegar primeiro as mulheres e depois matar todo mundo. Eu perguntei a ele o que nós deveríamos fazer. Ele respondeu: 'Fujam! Eu vou lá fora tentar detê-los'.

Nós éramos 15. Não dava para levar Ahmed conosco, porque ele estava muito machucado. Mas nós estávamos tão apavorados e com tanta pressa que nos esquecemos de levar Sarah, a minha irmão de oito anos de idade. Ela estava dormindo. Quando nos demos conta de que ela tinha ficado para trás, eu voltei à casa com a minha cunhada. Ouvimos os homens dizendo: 'Nós queremos as mulheres!'. Ao escutar isso, a minha cunhada disse: 'Não há nada que possamos fazer. Eles vão morrer'. Ela me puxou para trás, e nós fugimos.”

Testemunha 6
A mãe de Maryam Sayyi, Hana Harmut, permaneceu um pouco mais na casa e, na escuridão, não viu que os outros tinham fugido: “Eu voltei para a casa, onde ouvi as vozes dos homens lá dentro. Eu escutei Ahmed gritando, e depois ouvi Sarah, quando ela acordou e começou a gritar e a chamar em voz alta pela mãe. Eu ouvi o meu marido gritando: 'Ahmed não! Ahmed não!' Depois, escutei alguns tiros. Eu não sei quantos. A seguir tudo ficou silencioso por algum tempo. Depois eu ouvi um barulho que me deu a impressão de que eles estavam destruindo a cozinha. Talvez eles estivessem procurando por facas. A única coisa que me veio à cabeça foi encontrar uma maneira de fugir dali, de forma que me escondi em um estábulo próximo onde normalmente ficam os animais. Eu escutei os homens até duas ou três da manhã. Depois disso, o silêncio voltou."

A família Sayyid não era proeminente na oposição, nem apoiava o regime de Assad. Os sobreviventes acreditam que o nome do pai, Muawiya, foi um dos motivos pelos quais os Sayyid foram atacados. Muawiya foi também o nome de um califa que, mais de 1.300 anos atrás, lutou contra os imames que os xiitas consideravam os seus santos, e cujas mortes eles ainda lamentam atualmente em rituais. O nome é muito ofensivo para os xiitas radicais e, em um grau menor, para os alauitas, que fazem parte do mesmo grupo religioso. E esse certamente não seria o nome de um homem que tivesse se convertido ao xiismo.

Segundo sobreviventes, nem em Taldou nem em outras partes de Houla, não há, nem nunca houve, famílias xiitas nem alauitas, assim como não há famílias sunitas nas vilas alauitas vizinhas. Embora já tenha havido casamentos ocasionais no passado entre famílias alauitas e sunitas, os moradores locais dizem que em casos desse tipo a mulher sempre se muda para a vila do marido e converte-se à fé dele. Mas, e quanto às testemunhas anônimas que teriam dito que as vítimas do massacre de Houla não eram sunitas nem membros da oposição, mas sim apoiadores do regime de Assad?

Testemunha 7
O coronel Mohammed Tayyib Baqur, que serviu no exército sírio durante dois terços da sua vida e desertou algumas semanas atrás, trabalhou mais recentemente na divisão política do Ministério da Defesa. Ele relata agora que, no dia 28 de maio, recebeu um telefonema de Jamil Hassan, diretor de inteligência da força aérea síria e um dos principais membros do regime: “Ele me disse para ir até lá em 2 de junho. Ele observou que eu sou de Houla, e que estava em andamento uma conspiração internacional contra a Síria. Por esse motivo, ele queria que eu encontrasse algumas pessoas, as mais pobres possíveis, de Houla e das áreas circunjacentes. Eu deveria levar essas pessoas para Damasco de forma que elas divulgassem a versão do regime sobre ao massacre. Ele me disse que tanto essas pessoas de Houla quanto eu seríamos pagos. A seguir ele chamou o seu assessor e lhe ordenou que este me desse 25 mil libras sírias”. Isso equivale a pouco mais de 300 euros, ou US$ 385.

Baqur conta que após 35 anos no exército ele percebeu que tinha chegado a hora de mudar de lado. “Eu não queria mais fazer parte daquilo, de forma que coloquei a minha família em segurança e fugi."

Se os rebeldes de fato cometeram o massacre, por que o exército continuou a bombardear Taldou durante meses, mesmo nos dias em que os repórteres de “Der Spiegel” se encontravam lá? E se o Exército Sírio Livre foi o responsável pelo massacre, por que um grande número de membros do exército sírio desertou para a organização rebelde após o episódio?

Depois do massacre, moradores de Taldou enterraram os mortos em uma praça no centro da vila. Eles dizem que havia mais corpos do que os 108 que foram contados pelos observadores da ONU. Embora não seja mais possível verificar se isso é verdade, essa versão faz sentido, já que muitos dos corpos só foram recuperados dias após a retirada das tropas.

Já estamos em meados de julho, e alguns trabalhadores corajosos ainda estão cobrindo as sepulturas com mais terra, pois o terreno já se acomodou. Eles querem substituir os tijolos que foram espalhados pelo local por placas de pedra. Isso pelo menos será mais digno, diz um dos homens. Mas ele avisa que não é uma boa ideia ficar de pé ali por muito tempo. “Às vezes os soldados disparam foguetes dos canais contra este local.”

A algumas ruas de distância, na arruinada praça principal de Taldou, onde o exército tinha um posto militar que só foi abandonado seis dias após o massacre, ainda se pode ver um grafitti em um muro que os moradores locais dizem ter sido escrito pelos soldados: “Não fiquem muito chateados! Às vezes os cães dançam sobre o leão, sem saberem de fato que se tratava de um leão”.

O nome Assad significa leão em árabe.

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