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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O partido ultraconservador dos salafistas egípcios aposta nos jovens recém-formados


Manifestantes salafistas egípcios: partido foi a surpresa da eleição


Sari Galal nos recebe em casa, numa das muitas salas de sua luxuosa mansão, em uma bela avenida de Maadi, bairro residencial do Cairo. Vestindo o véu integral, essa jovem amável e atenta é um dos membros mais ativos do partido salafista Al-Nour. Ela mal esconde sua empolgação. Em alguns meses, essa engenheira informática de 27 anos foi promovida de simples membro a candidata ao Parlamento pelo partido.

Claro, nos cartazes eleitorais seu harmonioso rosto foi coberto por uma insígnia, e Sari foi colocada no final da lista para ter menos chances de ganhar, e, apesar do bom desempenho obtido por sua chapa, ela não foi eleita. Mas seu entusiasmo permaneceu intacto: “Eu pensava que teríamos muito mais votos”, ela lamenta. “O partido Al-Nour é tão popular, sobretudo entre os jovens!”

Fundado quatro meses após a revolução pela mais importante organização salafista egípcia (a dawa salafiya de Alexandria), o partido Al-Nour constitui hoje a segunda maior força política do novo Parlamento, atrás da Irmandade Muçulmana, com quase 25% dos votos. Esse sucesso eleitoral a surpreendeu muito, que está percebendo estupefata que o partido não atraiu somente os pobres, os fanáticos ou simplesmente salafistas.

Embora seus membros reivindiquem uma volta às fontes do islamismo, defendendo entre outros pontos o uso da barba, do niqab [véu que só revela os olhos] e a aplicação progressiva da sharia, o partido soube construir para si uma imagem jovem e moderna. Ele conseguiu mobilizar uma juventude instruída e politizada, saída dos mais diversos meios a quem ele conseguiu oferecer perspectivas de carreira política inesperadas e rápidas, ao passo que a Irmandade Muçulmana continua sendo uma organização muito hierarquizada.

O elegante e bem-vestido Nadir Bakkar, 27, é o queridinho dessa geração em ascensão de salafistas high-tech vestidos à maneira ocidental e de jovens ambiciosos ávidos para entrar na política. “Nas regiões muito pobres, as pessoas não se interessam pelo seu currículo”, explica esse porta-voz do partido. “Elas querem saber se você as ajudou ou não. Então nessas regiões escolhemos candidatos populares. Mas, nas outras, demos preferência aos tecnocratas, ou especialistas com verdadeiras competências. Entre os que se juntaram a nós, nem todos são salafistas: alguns são tecnocratas sem ideologia que acreditam que, através de nós, poderão aplicar seus planos para o desenvolvimento do Egito”.

Engenheiros, analistas de sistemas, empresários, médicos, professores, militantes do Al-Nour (que declara ter 100 mil membros) cuidam de suas imagens de genros ideais. Eles contribuem para dar ao partido, que segundo seu presidente conta com quase 50% de mulheres, uma cara agradável, jovem, dinâmica e qualificada, permitindo-lhes que eles invadissem o território da Irmandade Muçulmana.

Ao volante de sua caminhonete caindo aos pedaços, Adil Madhour, 45, não poupa elogios aos salafistas. Não seria com seu magro salário de treinador esportivo que esse modesto pai de família de 45 anos, campeão de halterofilismo e de luta, teria conseguido se candidatar em Helwan, um subúrbio industrial do Cairo onde desfruta de certa fama. Após a revolução, ele fervilhava com ideias e projetos.

“Os salafistas abriram suas portas aos jovens que queriam servir ao seu país. Com eles, puderam renovar quadras de esportes, organizar vendas de frutas e legumes diretamente do produtor ao consumidor sem lucros, montar mutirões veterinários para tratar animais no interior. Eles me propuseram que eu fosse o terceiro em sua lista, e eu aceitei. Eu não sou salafista, não me identifico com a doutrina, não entendo muito dela, mas concordo com eles, eles são mais claros que os outros”.



Polida, limpa, qualificada, dedicada, sensível, boa, humilde: a imagem dos salafistas é ótima entre muitos egípcios, que, aliás, nem sempre diferenciam muito claramente a Irmandade Muçulmana dos salafistas. Os militantes do Al-Nour defendem sua visão de um “Estado moderno” que não seria nem laico nem teocrático, e sim ultraconservador, apoiando-se na ciência e nos progressos técnicos para construir a prosperidade. Um ideal próximo dos países do Golfo, que muitos dirigentes conhecem bem, e que inspirou sua visão de um turismo que separa muçulmanos de não muçulmanos.

Mas a concepção, ainda que mínima, que os jovens do partido fazem da modernidade já entra em conflito com a dos xeques fundadores da dawa de Alexandria. Estes viram com maus olhos a decisão de inscrever sessenta mulheres para as eleições legislativas e conseguiram com que elas ficassem no fim da lista, para terem menos chances de ganhar. O método funcionou: nenhuma delas foi eleita.

Oficialmente, homens e mulheres não trabalham juntos, contentando-se em se comunicar por e-mail e telefone, mas o pragmatismo às vezes os leva a se reunirem discretamente, para desgosto dos xeques.

A dissonância que reinou dentro do partido durante a campanha mostra as tensões que atravessam a organização e na associação religiosa que lhe deu origem. Em dezembro, o partido teve de proibir que um de seus candidatos, o famoso pregador Abdel Moneim al-Shehat, falasse em seu nome depois que este último acusou as obras do Prêmio Nobel de Literatura Naguib Mahfouz de promoverem a prostituição e as drogas. “Suas declarações fizeram com que perdêssemos vinte cadeiras no segundo turno da primeira fase”, lamentou o porta-voz Yousry Hammad.

Entre o relativo pragmatismo dos jovens militantes e o rigorismo inflexível dos xeques, será que o partido conseguirá manter sua unidade? Estaria a mediocridade de seu programa eleitoral, que prudentemente evita a delicada questão da aplicação das penas islâmicas, ameaçando a construção ainda em andamento?

Nas novíssimas instalações que abrigam a sede do partido, Mohammed Nour não está preocupado. Para esse jovial empresário que comercializa aplicativos para o iPhone, o salafismo é flexível e tolerante. A invenção da qual ele mais se orgulha? Um aplicativo que automaticamente ativa a chamada para as orações nas horas certas.

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