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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Reprimidos nos anos 80, partidos islâmicos são os grandes beneficiários da Primavera Árabe

Coletiva de imprensa do partido tunisiano Ennahda, ganhador das recentes eleições

A Tunísia indica a direção. As maiorias parlamentares nos países árabes onde se realizarem eleições democráticas em boas condições se articularão ao redor de partidos islâmicos, todos eles, de uma ou outra forma, ramos nacionais ou derivações da Fraternidade Muçulmana, a veterana organização egípcia fundada em 1928 por Hassan el Bana. É o que acontecerá no Egito, que as realiza em 28 de novembro, e na Líbia, que quer realizá-las em oito meses; também em países onde não houve mudança, mas pode haver transição, como o Marrocos, que as efetua em 25 de novembro.

O Ocidente não aceitou a realidade do islamismo político em 1991, entre a primeira e a segunda etapa das eleições gerais na Argélia que dariam a vitória e o poder à Frente Islâmica de Salvação (FIS). Os militares, com o beneplácito de todas as capitais ocidentais, interromperam a transição, iniciada em 1989 com uma reforma constitucional e o desaparecimento do monopólio do partido único, a Frente de Libertação Nacional. Suspenderam as eleições, dissolveram o Parlamento, obrigaram o presidente Chadli Benjedid a se demitir, proibiram o FIS e implantaram o estado de emergência, que durou até 2011. O terrorismo e a repressão indiscriminada logo se transformaram em uma guerra civil que custou 200 mil vidas.

Vinte anos desde a primeira tentativa não passam em vão. Durante esses anos perdidos apareceu uma alternativa mais extremista e perigosa como é o projeto terrorista da Al Qaeda. A tentação violenta ficou majoritariamente desacreditada, embora ainda tenha adesões em lugares como a Faixa da Gaza.

Os partidos islâmicos sofreram sob as ditaduras, mas também tiveram ocasião de refletir sobre seus erros e a evolução de um mundo em mudança, no qual os benefícios da globalização se deslocam para os países emergentes. E, sobretudo, explodiram as revoltas da dignidade de ponta a ponta do mapa árabe.

Durante esses anos, o islamismo foi a principal força de oposição às ditaduras. Uma parte de seu êxito atual vem da proibição e a clandestinidade e foi ganho nos patíbulos, delegacias e cárceres, como ocorreu com o comunismo em países como a Espanha. Em muitos casos atuou como uma rede social que proporciona às camadas menos favorecidas a sensação de que alguém se encarrega dos cidadãos diante de um Estado ditatorial e corrupto. E conta com a força e a popularidade das mesquitas, isto é, do conservadorismo religioso e da tradição.

O islamismo não fez essas revoluções, mas será seu principal beneficiário.

Os jovens, que se lançaram às ruas das cidades árabes do Atlântico ao golfo Pérsico, a partir de janeiro passado, pouco tinham a ver com as irmandades muçulmanas organizadas para restaurar a pureza da sociedade islâmica contra a corrupção dos ditadores e da modernidade ocidental. Na Praça Tahrir, no Cairo, quase não se viam barbas nos primeiros dias, mas logo se apresentaram os disciplinados militantes para organizar a oração das sextas-feiras e segregar as mulheres. O impulso foi cosmopolita, laico e modernizador, mas a capitalização identitária, religiosa e tradicionalista.

Tudo isso preocupa os árabes mais laicos, que temem pelo tipo de Estado e de democracia que serão construídos. Uma democracia adjetivada como islâmica pode reduzir o campo de jogo e da pluralidade, ou simplesmente contar como uma opção a mais, a majoritária, dentro da pluralidade; assim como as democracias cristãs dentro dos Estados aconfessionais europeus. Se dos velhos partidos comunistas saíram formações reformistas e social-democratas, perfeitamente acomodadas às regras do jogo e preparadas para governar, nada impede que a Fraternidade Muçulmana termine constituindo a base dessa democracia islâmica.

Os temores não são gratuitos e têm uma base palpável: a segregação de sexos; a limitação dos direitos da mulher; a ocupação religiosa do espaço público; ou a pressão sobre os cidadãos de outras crenças, que no Egito tem reflexos de perseguição. A democracia não pode ser um mero trâmite nas urnas que abra as portas para a xariá. Significa instituições e equilíbrios entre poderes públicos, direitos e deveres dos cidadãos, igualdade diante da lei. Esse é o desafio do islamismo. E não há uma só xariá. Como não há um só islã.

Inclusive no islã político e conservador há pelo menos uma bifurcação, com um caminho autoritário que leva para a Arábia Saudita e outro democrático que conduz à Turquia.

O islã é uma solução, reza o slogan mais conhecido da Fraternidade Muçulmana. Não é verdade. O islã é, no máximo, o caminho obrigatório e inevitável nesta transição. Como lembra, uma e outra vez, o escritor egípcio Alaa al Aswany em seus artigos, antes e depois da queda de Mubarak, a solução é a democracia.

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