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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

ElBaradei e a democracia no Egito: "Não há como voltar atrás agora"

Após a revolução na Tunísia, observadores estão se perguntando se governos em outros países do Norte da África também poderiam cair. Em uma entrevista para a “Spiegel”, o egípcio ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Mohamed ElBaradei, fala sobre as consequências para o regime no Cairo e sua esperança de que os egípcios possam seguir o exemplo dos tunisianos.

Spiegel: Sr. ElBaradei, a oposição no Egito convocou um “Dia da Raiva” para terça-feira. O senhor apoia os protestos?

ElBaradei:
Sim, apoio. Eu apoio qualquer exigência pacífica por mudanças. Meu pedido por reformas não foi ouvido pelo regime, o que deixa a tomada das ruas como única opção. Essas são pessoas jovens e impacientes que agora estão demonstrando sua determinação, e eu espero que os protestos não saiam de controle.

O senhor acredita que os protestos realmente levarão a uma mudança?

Eles marcam o início de um processo histórico. Os egípcios reconheceram que precisam tomar as rédeas de seu próprio destino. Pela primeira vez na história recente do país, eles estão realmente preparados para tomar as ruas. O cultura do medo cultivada pelo regime foi quebrada. Não há como voltar atrás agora. Os ativistas esperam as maiores manifestações em décadas. Esses protestos são uma bola de neve que pode se transformar em uma avalanche.

E o regime ficará simplesmente olhando, sem fazer nada?

Eu espero que as forças de segurança não usem violência contra os manifestantes. Eu apelo ao presidente (egípcio, Hosni) Mubarak que não permita uma escalada da situação. O regime deve respeitar o direito universal à liberdade de manifestação.

O senhor irá às ruas pessoalmente?

Não, eu não quero roubar a vitória das pessoas que convocaram os protestos. Mas eu as apoiarei de qualquer forma que puder. No momento, eu sou mais útil ao movimento de modo estratégico, mesmo que às vezes nem mesmo esteja no Egito, do que seria nas ruas.

Como um adversário potencial de Mubarak na futura eleição presidencial em setembro, o senhor deseja mudanças por meio de eleições. Não é tarde demais para isso agora?
É bem possível que meu país esteja enfrentando uma fase de instabilidade. A liberdade tem seu preço. Mas todos, dos marxistas à Irmandade Muçulmana, concordam que a estabilidade precisa ser nossa meta.

O senhor deseja um Egito moderno, democrático. Mas as pessoas nas ruas não estão pedindo apenas liberdade e dignidade –elas também querem pão.

Essas exigências são compreensíveis em um país no qual mais de 40% da população ganha menos de US$ 1 por dia. Em nosso caso, (os protestos) também giram em torno de necessidades básicas, o que torna o Egito diferente da Tunísia. Ela possui uma grande classe média, enquanto poderíamos enfrentar uma revolta dos pobres e frustrados.

A autoimolação de um verdureiro provocou a revolução em Túnis. Várias pessoas já se incendiaram no Egito, mas Mubarak parece inabalado.

Não se deixe enganar. Essa frieza é apenas fachada. Secretamente, ele está extremamente nervoso. Ele nunca deu ouvidos e também não está ouvindo agora. O regime não quer ver ou ouvir nada. Eu alertei Mubarak sobre essa possibilidade. Agora ele está recebendo o que merece.

Ele ainda pode impedir os protestos de se espalharem?

Para isso, Mubarak teria que não concorrer à reeleição e permitir uma Constituição democrática que torne possível eleições livres. E, naturalmente, a lei marcial que foi imposta ao país nos últimos 29 anos teria que ser suspensa. Sem essas concessões, o regime não sobreviverá.

Israel teme uma revolução no Egito. Muitas pessoas em Jerusalém acreditam que a Irmandade Muçulmana chegaria ao poder e declararia guerra ao Estado judeu.

Nós temos que parar de satanizar a Irmandade Muçulmana. É incorreto que nossa única opção seja entre a opressão sob Mubarak e o caos dos extremistas religiosos. Eu tenho muitas diferenças com a Irmandade Muçulmana. Mas ela não promoveu nenhum ato de violência em cinco décadas. Ela também deseja mudanças. Se quisermos democracia e liberdade, nós temos que incluí-la, e não marginalizá-la.

O senhor concorda com a teoria do “efeito dominó”, que diz que a revolução em Túnis é apenas o início?

Talvez estejamos atualmente experimentando os primeiros sinais de uma “Primavera Árabe” (isto é, semelhante à chamada Primavera de Praga de liberalização política na Tchecoslováquia, em 1968). Nossos vizinhos estão observando o Egito, que sempre exerceu um papel pioneiro. Eu espero que meu país seja o primeiro em que a liberdade e democracia florescerão. Nós egípcios também devemos conseguir o que os tunisianos conseguiram.

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